#15 Primeiras vezes (ou as pequenas inaugurações da vida)

Primeiras experiências tem um gosto diferente. Ainda mais quando elas são vivenciadas na vida adulta. Na infância, é esperado que experimentemos o mundo. Mas aos poucos, nos acomodamos com o que já conhecemos. Limitamos e contornamos, pouco a pouco, nossos espaços.
Gosto de pensar em algumas maneiras diferentes de experimentar o novo. As vezes, é a partir de um encontro com o inédito. Em outras, o inédito está em nós. Na maioria delas, acontece das duas formas ao mesmo tempo. Por exemplo, tenho tido vontade de reler Cem anos de solidão. Não será a primeira vez que farei essa leitura, mas ainda assim esse segundo encontro será tão inaugural como o primeiro. De lá para cá, tanto em mim mudou. Talvez só agora possa ler e me dar conta de algo que antes não era possível. Sinto que ao longo da vida construímos sustentações para acomodar justamente o que já estava ali. Mas é criado só depois. Paradoxal, sim.

E é o que fazemos também em um processo de análise. Dizer o que já estava ali. Escutar outra vez e ainda assim, pela primeira vez. Um encontro que é sempre um reencontro. Inauguramos percepções conhecidas e assim, podemos experimentar o que nunca tinha sido. De leitura em leitura e palavra em palavra, o novo e o antigo se encontram. Experimentamos e tateamos o mundo como crianças, mesmo sendo adultos. Poder desejar, brincar e habitar lugares cada vez menos fronteiriços. Expandir as possibilidades, é isso que fazemos em análise e também, fora dela.

Existem também aqueles encontros que nos levam para lugares nunca antes habitados. Hoje vivi um desses. Durante a manhã, tive minha primeira aula de cerâmica. Já tem um tempo que me encanto com as peças desse material. Quem me acompanha pelo Instagram se acostumou a sempre ver uma xícara diferente por lá. Tenho colecionado artes feitas por outras mãos. Mas cultivo em mim, há ainda mais tempo, o desejo de fazer e moldar algo com as minhas próprias. Estar nesse lugar me fez pensar em tudo que pode ser construído aqui.
Não sei o que encontrarei nessa experiência. Mas certamente será diferente de tudo que já senti.
É sempre tempo de experimentar.
Espero que essa carta chegue por aí como incentivo
Seja por onde for, que você possa se encontrar com o que ainda não existe,
com o que ainda será construído,
criado,
inventado,
e sentido
que as pequenas inaugurações da vida te alcancem pelo caminho
“Nascer
Nascer outra vez bem no meio da vida
De fato acordar e enxergar cada dia”
-Tim Bernardes



Algumas recomendações:
✹ Tim Bernardes - Nascer, Viver, Morrer (Official Video)
✹
Nessa edição lindíssima, Maju escreve sobre as sutilezas que compõem nosso dia. Enquanto lia, pensei muito na importância do olhar inaugural. Poder ver de outra forma o que já estava ali. Deixo então a indicação dessa leitura <3
✹ E uma playlist para te acompanhar na leitura ( ou na escrita de uma carta de resposta, quem sabe ♡):
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Te escrevo em breve!
E adoraria receber seus escritos por aqui também! Me conta como você leu o que escrevi?
Até logo ♥
(📍 Escrevi essa edição no mesmo dia que comecei um novo diário, depois parei por um tempo e continuei a escrita ao sair da minha primeira aula de cerâmica. Me parece que esses encontros inaugurais abriram espaço para as palavras se encontrarem também. )
Que gostoso de ler, Mariana!! Me lembrei de uma frase da Ana Suy que diz: "A primeira vez de algo não para de acontecer em nós."
Eu sou doida pra fazer uma aula de cerâmica, conte a sua experiência! 🫶🏽
como sempre, muito bom te ler, mari <3 me conectei muito com as tuas palavras, e me lembrei quando fiz aula de cerâmica também. pensei muito no sensorial, no contato da nossa pele com a argila, nas sensações que isso traz e em como podemos deixar nosso lado mais criativo aparecer! tudo isso me faz pensar nas nossas primeiras experiências, de quando desde crianças deixamos nosso sensorial e espaço criativo aparecerem. adorei saber dos teus primeiros afetos <3